domingo, 13 de julho de 2008

A Igreja de Éfeso

A igreja de Éfeso é a primeira das sete igrejas descritas simbolicamente no livro de Apocalipse. Para os mestres da interpretação bíblica, cada uma das igrejas representa um determinado período na história da Igreja de Cristo na Terra, desde o seu início, a partir de Cristo, até a Sua volta. Eu pessoalmente entendo um pouco diferente. A meu ver, além de uma delimitação cronológica, há também uma coexistência no tempo de algumas (senão todas) dessas igrejas. Na atualidade por exemplo, podemos ter povos ou igrejas cristãs que se comportam como Sardes, outros como Laodicéia e assim por diante. Tanto isso pode ser possível que, ao descrever as quatro últimas igrejas (ver Apocalipse 2:29, Apocalipse 3:6, Apocalipse 3:13 e Apocalipse 3:22), João encerra a descrição de ambas com as mesmas palavras (“Aquele que tem ouvidos ouça o que o Espírito diz às igrejas”) e nas demais ele diz a mesma coisa só que no decorrer (e não no final) da sua descrição (Apocalipse 2:7, Apocalipse 2:11 e Apocalipse 2:17). Ou seja, a mensagem do Espírito para aquele que lê, é que ouça atentamente o que o Espírito diz às Igrejas (no plural) e não ao que diz a uma delas apenas.

Éfeso então, na interpretação dos mestres, representou na história a igreja do primeiro século. Contudo, ao analisarmos o que a Bíblia diz e as recomendações à essa igreja, vemos que algumas de suas características são bastante aplicáveis à igreja do nosso tempo. Vejamos então como a Bíblia a descreve:

Escreve ao anjo da igreja que está em Éfeso: Isto diz aquele que tem na sua destra as sete estrelas, que anda no meio dos sete castiçais de ouro: Conheço as tuas obras, e o teu trabalho, e a tua paciência, e que não podes sofrer os maus; e puseste à prova os que dizem ser apóstolos, e o não são, e tu os achaste mentirosos. E sofreste, e tens paciência; e trabalhaste pelo meu nome, e não te cansaste. Tenho, porém, contra ti que deixaste o teu primeiro amor. Lembra-te, pois, de onde caíste, e arrepende-te, e pratica as primeiras obras; quando não, brevemente a ti virei, e tirarei do seu lugar o teu castiçal, se não te arrependeres. Tens, porém, isto: que odeias as obras dos nicolaítas, as quais eu também odeio. Quem tem ouvidos, ouça o que o Espírito diz às igrejas: Ao que vencer, dar-lhe-ei a comer da árvore da vida, que está no meio do paraíso de Deus.” (Apocalipse 2:1-7)

Apesar da igreja de Éfeso ter sido uma das igrejas que foi censurada por Deus, as suas qualidades também foram evidenciadas. A primeira delas foi o trabalho. A igreja de Éfeso ao que parece não soube o significado da palavra preguiça. Sendo a igreja do primeiro século, num tempo onde o cristianismo praticamente não existia em números significativos, essa igreja trabalhou para a expansão do conhecimento de Cristo. Parece ter de fato ter vestido a armadura de Deus, recomendada por Paulo (Efésios 6:11).

Outra qualidade dessa igreja era a paciência (ou, em outras traduções, perseverança). A paciência e a perseverança são qualidades que só se adquire em tempos de sofrimento. Pelo que a Bíblia aponta, parece que a Igreja de Éfeso foi, a exemplo de Cristo, perseguida entre os homens, mas nem assim deixou sua fé de lado. Soube ser perseverante no meio das adversidades e manteve sua fé inabalável frente às perseguições.

Uma outra qualidade bastante interessante dessa igreja era a de que ela soube provar (ou testar) aqueles que se diziam apóstolos. A Bíblia aponta que já naquele tempo, distante da apostasia dos últimos dias, já existiam os falsos apóstolos e falsos mestres, que foram devidamente provados e reprovados ao serem confrontados com a genuína palavra de Deus, pregada pelos apóstolos (1 João 4:1). Se em muitas de igrejas de hoje, a submissão incondicional à liderança tem aberto a porta das igrejas à falsas doutrinas, a igreja de antigamente nos deixa um ensinamento contrário a tais práticas.

Mais uma de suas qualidades: o sofrimento. Eu pessoalmente acredito que aqueles que na terra sofreram e morreram como mártires de Cristo terão um reconhecimento especial nos céus. E me baseio na Bíblia para pensar isso (Mateus 5:11-12 e Apocalipse 17:6). Outro dia lia aquele livro “O Homem do Céu” e confesso que me senti até mal ao ver como aquele homem sofreu perseguições, os mais diversos tipos de torturas por amor ao evangelho e depois vi a mim e a muitos cristãos da igreja brasileira, que mesmo sem qualquer tipo de perseguição política, fazem bem menos que do que aquele homem faz num país onde o evangelho é tão combatido. Assim como ele, quase 2.000 anos antes a igreja de Éfeso padeceu perseguições e parece ter encontrado o mesmo destino: a perseverança.

Eis ainda a última das qualidades dessa igreja: “odeia a obra dos nicolaítas”. O nicolaísmo é uma prática antiga e ainda comum nas igrejas da atualidade, sobre a qual falarei detalhadamente num dos próximos artigos. Por ora, basta entendermos o significado das palavras. A palavra nicolaísmo é formada por Nikao (conquistar, estar sobre) e Laos (povo, comum, secular). Assim, Nikolaikos significa “aquele que domina sobre o povo”. Orientando o trabalho de cada um e assim por todos, a igreja de Éfeso combateu a existência de uns dominando sobre os outros dentro da igreja. Éfeso entendeu a orientação de Cristo de que a igreja é um reino de sacerdotes e o ideal é que não existam tantos níveis de hierarquia dentro da igreja, já que a função de cada um é a mesma: anunciar o evangelho de Cristo (1 Pedro 2:8-9 e Êxodo 19:6). Sendo Cristo o Cabeça da igreja e, de acordo com a Bíblia, o único representante de Deus perante os homens (1 Coríntios 11:3 e Efésios 5:23), o governo humano deve ser mínimo ou quase nulo dentro da genuína igreja cristã. Éfeso entendeu isso e certamente cumpria a vontade de Deus conforme a simplicidade de seus ensinamentos, hoje apontados na Bíblia.

Após tantas qualidades, Éfeso também teve defeitos. E por Deus foi censurada por seus eles. Deus tinha contra esta igreja que ela havia abandonado o primeiro amor. Mas o que é o primeiro amor?

Para entender o significado dessa expressão, basta ver um novo convertido. Já percebeu como se comporta o novo convertido quando aceita Jesus Cristo? Parece ter encontrado um tesouro! Ele não quer saber de outra coisa a não ser conhecer Jesus Cristo e a sua palavra. No início tudo é amor. Mas, na maioria dos casos, parece que a “paixão” pelo evangelho vai se esvaindo, as seduções mundanas de antes parecem ser mais chamativas e boa parte daqueles que mais se “empolgaram” quando aceitaram a Cristo, acabam em pouco tempo voltando ao mundo.

Na Bíblia, esse abandono do primeiro amor se refere ao primeiro e profundo amor que aquela igreja tinha pelos ensinamentos de Cristo. Mas após algum tempo, aquela igreja, após conhecer a doutrina correta, seguia a alguns mandamentos, se reunia com freqüência, mas deixou o amor sincero a Jesus Cristo e à Sua Palavra. Assim, entendemos o alerta de Cristo a essa igreja de que o amor é mais importante do qualquer esforço ou cerimonialismo religioso. A Igreja de Éfeso teve qualidades de sobra. Qualidades que muitas igrejas de hoje em dia passam longe de ter. Mas para Deus, o amor é a demonstração maior daqueles que O conhecem (1 João 4:8) e a maior de Suas leis (Romanos 13:8). Assim, a perseverança e o trabalho de Éfeso seriam reduzidos a nada se ela não se convencesse da necessidade de voltar ao amor de Deus da forma que era no princípio.

Como Éfeso, muitas igrejas atuais passam pelo mesmo problema: o abandono do primeiro amor. Seduzidos com ofertas do mundo – que às vezes nem possuem aparência explicitamente pecaminosa - como bons empregos, novas oportunidades e até cargos eclesiásticos, muitos têm deixado o primeiro amor e as primeiras obras, muitas vezes sem sequer ter percebido.

Como última recomendação, Deus afirma que se Éfeso não se arrepender, Ele “removerá o castiçal” dessa igreja. Mas o que é isso?

O castiçal (ou candelabro) é um objeto em metal que tem uma função: sustentar a luz. Acima dele vai um número ímpar de velas ou lâmpadas que iluminam um ambiente. Se acima dele não houverem velas acesas, sua função é apenas decorativa. No Tabernáculo, o castiçal tinha a função de iluminar permanentemente o templo (Levítico 24:2), constante, como deveria ser a presença de Deus.

Assim é a Igreja. A igreja é como se fosse um castiçal, que sustenta a luz do mundo, que é Jesus Cristo (João 12:46). Quando não faz isso, ela não cumpre sua função, e acaba funcionando como um castiçal sem velas, que nada ilumina e não passa de um elemento decorativo. Sem o arrependimento genuíno, a igreja de Éfeso continuaria a ser um “castiçal decorativo”, e seria removida por Deus!

O castiçal que não fornece luz é removido! A função do castiçal que a igreja é chamada a realizar é prover luz ao mundo. Não cumprindo essa função, não há sentido nenhum para que a Igreja exista.

Interessante observar que o Senhor não fala de apagar ou destruir o castiçal, mas de tirar do seu lugar. Se o castiçal é tirado de um lugar, é porque há um outro lugar onde ele pode ser útil, ou seja, voltar a iluminar. Ou seja, a igreja de Deus e a Sua presença estarão onde ela for clamada e será estabelecida em meio aqueles que se dispuserem a trabalhar e a amar a Sua Obra. Se os que hoje têm essa função amanhã não se dispõem a isso, outros são chamados para “substituí-los” (Marcos 12:9).

Por mais curioso que seja, o que é narrado na Bíblia de fato aconteceu literalmente naquela igreja. Por mais de mil anos não têm havido igrejas na região de Éfeso. O castiçal daquela igreja foi removido. Hoje há igrejas em Roma, Corinto, Tessalônica, mas não há mais igrejas em Éfeso. Seria apenas uma coincidência ou a prova que as igrejas de Apocalipse são bem mais do que apenas genéricas ou simbólicas? Deixo a conclusão ao que lê.

Entretanto, o que não tem dado margem a muita interpretação é uma outra triste conclusão: a de que a igreja do nosso tempo está caminhando nos mesmos trilhos de Éfeso. Tanto que se os “últimos dias” se estendessem, o número de salvos seria proporcionalmente menor (Mateus 24:22)!

A mensagem a Éfeso vem a nós como alerta: Até que ponto estamos vivenciando o amor de Deus em nossas vidas? Será que estamos vivendo a plenitude do amor de Deus, ou estamos apenas enganando a nós mesmos, quando vamos a igreja, fazemos nosso trabalho ministerial e depois voltamos para casa como se estivéssemos cumprindo tão somente uma rotina dominical? É preciso cuidado pra que não sejamos pegos pelos calcanhares, quando formos cobrados pelo amor de Deus que tivemos em nossas vidas e quanto desse amor demos uns aos outros. A lição de Éfeso para a igreja de nosso tempo não é outra, senão a de que sem o primeiro amor, toda a obra que fazemos a Deus é em vão.

Porque quem ama aos outros cumpriu a lei.” (Romanos 13:8b)

Um comentário:

Anônimo disse...

Deus te dê mais água desta Fonte. Deus te abençoe.