Um dos maiores problemas do nosso país chama-se imprensa. Em outra oportunidade, comentou-se aqui como ela influencia as pessoas, as manipula, semeia valores morais contrários à Palavra de Deus, dita regras de comportamento e perverte a interpretação daquilo que é real. A maioria da população acredita que aquilo que vêem na Rede Globo ou lêem na Revista Veja é a reprodução fiel da verdade dos fatos. O brasileiro não julga a informação que ouve, apenas acredita. Por outro lado, as pessoas ficam reféns desses principais meios de comunicação de massa, na medida em que dificilmente dão a devida atenção a fontes alternativas que trazem a informação sob visões diferentes desses meios principais e pior - elas dificilmente acreditam totalmente em notícias pouco divulgadas na grande mídia.
Paralelamente à corrupção das comunicações, o panorama religioso do Brasil tem mudado significativamente nos últimos anos, principalmente no que diz respeito aos dois maiores grupos religiosos do Brasil. A cada ano que passa, a Igreja Católica sofre decréscimo no número de fiéis no país, além do índice de “praticantes” entre os que se declaram católicos ter também diminuído. Ao mesmo tempo, naquele que é considerado o maior país católico do mundo, o número de evangélicos tem crescido a olhos vistos. Estima-se que se nos próximos anos o seu crescimento continuar na mesma proporção, em 2020 mais da metade da população se declarará evangélica.
Mas o que a mudança do panorama religioso do Brasil tem a ver com a ação da grande imprensa? É que um acordo de grande relevância política e jurídica vem tramitando nos bastidores de nosso país e os maiores meios de comunicação tem ocupado um papel importante na promoção deste, na medida em que tem sido coniventes, não dando a devida publicação que esse fato merece. E o pior é que esse acordo trará implicações que poderão afetar significativamente a liberdade religiosa em nossa nação nos próximos anos.
Antes de falar desse acordo, é importante saber que desde o fim do período monárquico em nosso país e da instituição do modelo republicano no Brasil, ocorrido no final do século XIX, as Constituições (lei máxima do país) passaram a possuir sempre uma cláusula de separação entre Igreja e Estado. Na atual Constituição, promulgada em 1988, essa cláusula está expressa no artigo 19, que proíbe o governo de financiar ou embaraçar qualquer tipo de religião ou de criar distinções de tratamento entre elas. Por causa disso, o Brasil então é um país laico, ou seja, um lugar onde o Governo deve trabalhar pela liberdade religiosa e ao mesmo tempo não apoiar financeiramente nem oferecer qualquer tipo de vantagem extra a nenhuma religião.
Pois bem, esse suposto acordo assinado entre o Brasil e o Vaticano no final do ano passado fere gravemente essa laicidade do Estado. Para que sse acordo do qual falamos seja “oficializado” no país, o mesmo precisa cumprir 3 etapas, e 2 já foram atendidas. Já foi assinado pelo presidente e aprovado no mês passado na Câmara, faltando agora apenas a aprovação no Senado para entrar em vigência.
Agora você pode estar se perguntando: como um simples acordo religioso pode influenciar tanto um país? Para responder a essa pergunta, é necessário falar um pouco de direito internacional.
Todo país tem sua Constituição e suas leis. Mas às vezes dois ou mais países querem fazer alguma espécie de acordo que traga algum tipo de vantagem a um deles ou a ambos. Para isso eles precisam “negociar”, estipular as regras desse acordo, afinal muitas vezes está se falando de países que possuem leis e restrições internas diferentes.
Quando um destes países é o Vaticano, além dos Tratados Internacionais, existe a figura da chamada concordata. A Concordata é um espécie de acordo entre a “Santa Sé” e um determinando país (que geralmente tenha uma significativa parcela de sua população professando o catolicismo romano). Como são regidos pela lei internacional, em vários países (inclusive no Brasil), as Concordatas podem se sobrepor à legislação nacional. Um país não pode se comprometer numa Concordata a adotar determinanda prática e depois editar uma lei legitimando o contrário, pois essa nova lei ficaria sem efeito legal, dado à precedência daquela sobre esta.
Fica evidente que uma Concordata carrega uma força legal suficiente para que o Vaticano interfira diretamente em questões internas do pais, nos temas que foram tratados na Concordata. Assim, elas acabam por ferir o processo democrático, pois tira do Poder Legislativo a prerrogativa de modificá-los, como podem fazer no caso de leis comuns.
A Constituição brasileira prevê que quando um tratado (como uma Concordata, que é um tipo de tratado) sobre direitos humanos for aprovado pelo Senado e pela Câmara, cumprindo os requisitos legais, eles poderão vigorar no país no mesmo nível de hierarquia do que uma emenda constitucional, ou seja, acima das leis ordinárias (artigo 5º, §3º). Mas é claro que uma Concordata traz consigo interesses político-religiosos, e não de direitos humanos. Mas esses interesses religiosos são “maquiados” sob a aparência de direitos humanos, para que a inconstitucionalidade não seja tão explicita. No próprio acordo assinado no final de 2008, quando se vê a expressão “reafirmando a adesão ao princípio (...) de liberdade religiosa”, ela nada mais é do que é um “enfeite” (já que a liberdade religiosa pode ser entendida como um direito humano), pois as normas previstas no acordo evidentemente estão promovendo vantagens à Igreja Católica e sequer cita nominalmente algum outro grupo religioso favorecido. Com isso, os direitos humanos, que não são absolutos, são facilmente manipulados e esse acordo nada mais faz do que obrigar o Brasil a dar privilégios à Igreja Católica no Brasil, sem garantir nada a nenhuma outra religião!
Ai você pode se perguntar: Por que a Igreja Católica tem todo esse poder, como nenhuma outra religião? A resposta é que esta igreja, como nenhuma outra religião, está politicamente organizada como Estado independente, como todos os demais países! Assim como os Estados Unidos podem assinar um acordo com o Brasil, o Vaticano pode. Só que num acordo entre dois países, geralmente ambos tem algo a ganhar. No caso das Concordatas, quase sempre só o Vaticano ganha, ao aumentar a sua influência em países católicos. É por isso que esses Tratados possuem tantas “entrelinhas” e que requerem tanta discussão. Os parlamentares do país, que deveriam se opor a acordos como esse, geralmente não se opõem. Talvez por acharem que esses acordos são irrelevantes ou por simplesmente não querer entrar em “questões religiosas”, que são sempre polêmicas e não trazem votos. É por isso que só são assinadas em Concordatas em países de maioria católica, como o Brasil ainda é. E nos últimos anos, o Vaticano sabendo da crescente perda de fiéis no país, tem corrido contra o tempo nos bastidores para aprovar esse acordo.
Se o país não pode alterar esse tratado depois de assinado, como esse acordo pode ser modificado? Apenas por consentimento mútuo. Ambas as partes precisam aceitar para que a concordata tenha suas cláusulas alteradas. O que não é interesse do Vaticano, que não terá interesse algum em perder nenhum de seus privilégios ou sua influência ideológica dentro de um país.
Por trás de uma simples assinatura, de um governante que não fica mais do que 4 ou 8 anos no poder, traz implicações sérias. A influência que a Igreja passa a exercer num país após a assinatura de um documento é sobremodo grande, pois a partir do momento que um país “legaliza” uma concordata, fica então vinculado a diversas obrigações diante da Igreja e suas instituições. Esta, além de ampliar seus privilégios, passa a ter o direito de receber diversos subsídios do governo, o que é uma solução importante para um problema que passa no Brasil: o declínio do número de fiéis. A diminuição da contribuição voluntária por dízimos e ofertas de destes, é substituída por um espécie de contribuição involuntária, onde eu e você seriamos “mantenedores vitalícios” da Igreja Católica, independente da religião que professemos, através dos impostos que pagamos.
Essa concordata assinada entre Brasil e Vaticano chama a atenção inclusive fora do nosso país. Veja o que o site “Concordata Watch” fala a respeito desse acordo:
“O artigo 3º introduz a Lei Canônica do Vaticano no Brasil. (...) O artigo 5 º coloca as organizações de serviço social da Igreja em uma posição de organização social legal e, portanto, com paridade financeira com as estatais de serviços sociais. Em outras palavras, o contribuinte brasileiro é obrigado a financiar esses serviços sociais da Igreja. (...) O artigo 15 garante à Igreja a situação fiscal de uma instituição de caridade. No entanto, outros países já mostraram exemplos de como essa cláusula pode ser explorada para permitir que a Igreja derrube concorrentes comerciais. Na Itália, basta erigir um pequeno santuário no interior das muralhas de um cinema, estância de férias, loja, restaurante ou hotel para que a Igreja Católica escape de pagar 90% do que deve ao Estado para as suas atividades comerciais. (...) Todas as diferenças relativas à concordata "devem ser resolvidas por negociações diplomáticas diretas". No entanto, isso significa que não há possibilidade alguma de recurso na Constituição ou aos tribunais brasileiros. Para mudar alguma clausula no futuro, o Brasil teria de convencer o Vaticano antes de qualquer reforma no acordo. E um país recentemente tentou negociar. Em 2006, um ministro húngaro foi ao Vaticano para tentar renegociar a “Concordata de Finanças”. Chegando lá ele percebeu que simplesmente ninguém tinha tempo para falar com ele. Concordatas são para sempre.” (Adaptado e traduzido de http://www.concordatwatch.org/showtopic.php?org_id=15311&kb_header_id=37281)
No próximo artigo, falaremos com um pouco mais de detalhe as implicações práticas desse acordo e de como sua aprovação poderá mudar nossas vidas no futuro.
“E por avareza farão de vós negócio com palavras fingidas; sobre os quais já de largo tempo não será tardia a sentença, e a sua perdição não dormita. (2 Pedro 2:3)
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